Editorial Mea culpa é insuficiente

Publicado em: 23/08/2018 03:00 Atualizado em: 23/08/2018 09:40

O papa Francisco, em carta aos católicos, reconheceu os casos de pedofilia envolvendo religiosos na Pensilvânia (Estados Unidos). Além de pedir perdão, expressou “arrependimento” pela demora da Igreja em agir. Por quase 70 anos, pelo menos mil crianças e adolescentes foram vítimas dos inescrupulosos, cujos atos foram acobertados pela instituição. Algumas adolescentes engravidaram de padres, que custearam o aborto. O pontífice admitiu “vergonha e arrependimento pelo escândalo”.

O documento, dirigido a mais de 1,2 bilhão de católicos, foi a reedição de outras declarações do Vaticano, após a descoberta de episódios idênticos. A pederastia em Boston, também nos Estados Unidos, por décadas, envolveu 90 padres, e inspirou o filme Spotlight — Segredos Revelados, vencedor do Oscar 2016, nas categorias de melhor filme e de melhor roteiro original. O cardeal Bernard Law, morto em dezembro do ano passado, foi acusado de acobertar os abusos cometidos pelos clérigos de Boston. Apesar de ter renunciado ao cargo, em 2002, durante o pontificado de João Paulo II, ele passou a viver em Roma, com as mesmas regalias de cardeal, e nunca prestou quaisquer esclarecimentos à Justiça norte-americana.

No Chile, um pacto de silêncio protegeu, durante décadas, o padre Fernando Karadima e outros sacerdotes acusados de pedofilia. O acordo foi quebrado quando 34 bispos apresentaram renúncia ao papa Francisco, e acusaram o bispo Juan de Barros de ter sido negligente ante os abusos cometidos por Karadima, protegido pelos conservadores. O papa, que, no primeiro momento, defendeu dom Juan, admitiu que errou na avaliação diante das provas apresentadas por familiares das vítimas. Em abril deste ano, a Justiça peruana condenou, por atentado violento ao pudor, o padre Luiz Hernan del Carpio Costa, da Paróquia Nossa Senhora de Guadalupe, Nova Chimbote. Ele molestou uma menina de 12 anos que integrava o coral da igreja. Na Austrália, o cardeal George Pell foi “compreensivo” com os vários sacerdotes acusados de abusar sexualmente de jovens.

Apesar das muitas denúncias que comprometem a imagem da Igreja, o papa Francisco enfrenta a resistência do clero conservador para a tomada de decisões mais drásticas contra os abusadores. Os pedidos de desculpas dos líderes católicos são recorrentes e revoltam os fiéis. Os católicos cobram uma depuração na instituição, como o banimento dos criminosos e de todos que os acobertaram na estrutura hierárquica: bispos, arcebispos e cardeais, sem prejuízo das ações criminais a que devem responder. Familiares e vítimas da Pensilvânia exigem também que o Vaticano acate as recomendações do Grande Júri. Não há outra opção para a cúpula da Igreja. Proteger os pedófilos sob o manto da impunidade seria negar todos os dogmas éticos, morais e religiosos secularmente pregados aos católicos. Mais: “os pequenos” continuarão abandonados pela Santa Madre Igreja .

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