Tratando diferentes como iguais

Sara Noël-Bouton
Advogada e fundadora da associação Horizon, para crianças portadoras de limitações motoras, tem um filho de quatro anos com paralisia cerebral.

Publicado em: 15/08/2018 03:00 Atualizado em: 15/08/2018 08:54

Defender a inclusão social não é apenas garantir direitos para aqueles que possuem alguma necessidade especial, mas também é educar e pensar o ambiente para que os “diferentes” sejam tratados e vistos como “iguais”. Em vivência fora do Brasil, notamos que os cidadãos com necessidades especiais podem ter uma grande autonomia no seu cotidiano, proporcionada pela acessibilidade pensada a 100%, seja no trabalho, seja nos transportes, seja nos acessos, nos meios digitais, etc.

Isso se torna possível porque, primeiro, há um atendimento de qualidade na infância, com clínicas e hospitais com abordagem multidisciplinar, com o uso de equipamentos modernos e feitos sob medida, ajustados à necessidade de cada paciente. Segundo, porque há uma preocupação em proporcionar uma acessibilidade universal, ou seja, em pensar o ambiente de maneira a que seja acessível a todos.

Segundo o IBGE, 24% dos brasileiros possuem algum tipo de deficiência - cerca de 45 milhões de pessoas, mas menos de 1% delas estão empregadas. Podemos imaginar que isso se deve, por um lado, a um desconhecimento sobre como tratar uma pessoa que apresente algum tipo de deficiência. Por outro lado, existem as barreiras arquitetônicas e tecnológicas que dificultam o acesso das pessoas deficientes ao mercado de trabalho.

Existem cidadãos com os mais diversos tipos de deficiência no Brasil e frequentemente essas pessoas são rotuladas como incapazes, e isto, de fato, não é verdade. A pessoa pode possuir um comprometimento em alguma parte do corpo, mas isso não significa que a mesma não esteja apta para realizar outras funções que sua condição não impeça. Esses cidadãos se deparam com muitas dificuldades para se inserirem no mercado de trabalho, pois grande parte das empresas não oferecem oportunidades além das que já são obrigadas por lei.

O futuro é outra dimensão que também não pode ser esquecida, pois é preciso estar preparado para a rápida evolução tecnológica destes novos tempos, que influencia e modifica o processo educativo e a nossa relação com a construção do conhecimento. Por isso, para a estimulação da pessoa com deficiência, a tecnologia da informação é fundamental, pois a velocidade da renovação do saber e as formas interativas da cibercultura trazem uma nova expectativa de educação para eles. É necessário, portanto, criar serviços e propostas educativas abertas e flexíveis que atendam às necessidades de mudanças.

Nesse sentido, é importante haver políticas públicas, mas é o tratamento de qualidade na infância e a formação educacional e profissional adequada das pessoas com deficiência que vão determinar a sua inclusão natural no mercado de trabalho. O deficiente tem a sua dignidade e quer ter acesso ao trabalho por sua competência e não por um favor. Respeitadas as suas necessidades especiais, ele deve ser tratado como qualquer outro trabalhador.

No Brasil, a cidade de Uberlândia (MG) se destaca pelo avanço em termos de acessibilidade universal, tendo recebido vários prêmios e reconhecimento internacional. Pessoas com deficiências gravíssimas podem levar uma vida independente e autônoma, com pleno acesso ao emprego, graças a essas medidas.

O envolvimento de toda a sociedade é primordial.  Isso pode ser incentivado, por exemplo, através de isenções fiscais para empresas que incorporem mecanismos de acessibilidade universal. Acessibilidade não é um problema que envolve apenas deficientes, mas diz respeito também a idosos, mulheres grávidas, pessoas transportando carrinhos de bebê, acidentados etc. Hoje são eles, amanhã podemos ser eu ou você. Promover a acessibilidade e a inclusão social é responsabilidade de cada um de nós, cada qual na sua área de atuação.

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