O Apagão das Canetas

Alexandre Rands Barros
Economista, PhD pela Universidade de Illinois e presidente do Diario de Pernambuco

Publicado em: 28/07/2018 03:00 Atualizado em: 30/07/2018 09:03

Desde a Constituição de 1988 que o setor público se tornou o maior entrave ao desenvolvimento econômico brasileiro. Criaram-se regras demais e deu-se muito poder a esse setor para barrar o desenvolvimento da produtividade no Brasil. Direito aos funcionários públicos serem prepotentes, autoritários e arbitrários; proteção à ineficiência e imobilismo deles, direito de parar, encarecer e atrasar tremendamente investimentos, e elevar substancialmente os riscos dos empreendimentos são alguns dos muitos instrumentos constitucionais postos à disposição dos agentes públicos. E eles estão cada dia mais eficientes na utilização desses instrumentos com o fim de prejudicar o desenvolvimento do Brasil. Agora, vivemos uma nova fase desse processo de atrapalhação, que é a era do Apagão das Canetas. Criou-se tantas regras e os órgãos de controle se tornaram tão eficientes em obstaculizar o desenvolvimento e condenar todos os cidadãos brasileiros igualmente de forma democrática e universal, atingindo tanto quem quer gerar progresso como quem quer assaltar os cofres públicos, que hoje ninguém quer se responsabilizar ou pôr sua assinatura em nada mais de consequências relevantes. O setor público está parando de vez. Essa postura dos agentes de controle está causando uma cisão na classe dominante do Brasil e com isso está parando o país.

Na redação da Carta Magna de 1988, que talvez já devesse ser de fato chamada de Carta Maligna, promoveu-se uma revolução no Brasil. A classe dominante, que antes era formada por grandes empresários e militares corruptos, foi desbancada e o país passou a ser controlado hegemonicamente pela burocracia estatal de alto escalão (BESTAES). O processo não foi imediato, pois esse segmento social não estava consolidado. Encontrava-se ainda desorganizado, mas sua maturação e apropriação do poder já foi assegurado nas regras estabelecidas. Pois a BESTAES trazia o trunfo de ser o sonho de pertencimento das classes sociais que derrotaram o regime militar: a classe média, principalmente a que vivia em torno do setor público. Une-se aí dois segmentos, os funcionários públicos propriamente ditos, e os corruptos que viviam no seu entorno. As classes trabalhadoras, obtiveram alguns ganhos aparentes na Carta Maligna em troca de seu suporte e participação na luta. Entretanto, foram na sua maior parte de natureza populista, pois na verdade lhes eram também prejudiciais. A própria consolidação do poder dos sindicatos e da justiça do trabalho às custas de redução brutal do ritmo de elevação da produtividade é um exemplo. Os ganhos possíveis de curto prazo, retiram bem-estar do trabalhador no longo prazo, ao decorrer de sua vida, por causa da perda de renda que adviria do maior crescimento econômico de longo prazo.

A partir dessa consolidação da BESTAES no poder, o que veio com seu amadurecimento, surgiu uma fonte importante de cisão dela. Os órgãos de controle e o judiciário não só afundam a sociedade, mas aumentaram também sua condenação dos indivíduos do próprio alto escalão do executivo, seja por tentativas de desvios de recursos mesmo ou apenas por agirem para gerar progresso. Como consequência, eles estão parando o Brasil, pela relutância dos BESTAES do executivo de verdade (exclui os órgãos de controle) de se responsabilizarem por ações que venham a transformar o país e fazê-lo evoluir. O resultado é que o setor público está ficando muito ineficiente e o país desgovernado. Isso ocorre em todos os níveis de poder, desde o Governo Federal, até os municípios pequenos. Esse processo está levando a colapso do país e certamente é o substrato para uma mobilização da sociedade para uma nova revolução. As manifestações no governo Dilma tinham parcialmente esse objetivo, entre outros, mas até elas foram capturadas pela BESTAES e resultaram apenas em um grito contra a corrupção que findou apenas por retirar o PT do poder. Não foram capazes de promover as mudanças necessárias e até fortaleceram a BESTAES, no final.

Novas manifestações serão necessárias caso o novo Congresso Nacional eleito não esteja alerta ao poder da BESTAES, e possa trazer o comando do Brasil para seus verdadeiros donos, os trabalhadores e os empresários, de todos os portes, igualmente representados como cidadãos. Infelizmente falta hoje uma liderança capaz de conduzir esse processo revolucionário. Pelo quadro eleitoral que se apresenta até então, não parece que nessa eleição já vamos entregar o comando a pessoas aptas a promover essa revolução. Mas o Apagão das Canetas, que nos tem gerado tantos sacrifícios por causa da letargia do setor público, e consequente lentidão do crescimento econômico, ao menos pode eventualmente nos legar um benefício importante para todos os brasileiros, que é eliminar esse poder da BESTAES num futuro próximo.

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