Editorial As responsabilidades de Obrador com o México

Publicado em: 03/07/2018 03:00 Atualizado em: 03/07/2018 09:09

O esquerdista Andrés Manuel López Obrador venceu por larga margem as eleições do México, mas são muitas as dúvidas sobre sua capacidade de colocar em prática o programa de governo que prometeu durante a campanha. Assim como no Brasil, onde é enorme o desencanto com os políticos, há enormes problemas a serem enfrentados naquele país, a começar pela corrupção que está entranhada no sistema público. Não por acaso, Obrador disse que, se fosse o escolhido pelos mexicanos, atacaria, sem piedade, “a máfia do poder”.

O México vive momentos terríveis. A violência aumentou a níveis assustadores. Mais de 30 mil pessoas são mortas por ano — 85 por dia. A pobreza não dá trégua. Segundo as estatísticas, metade da população vive hoje sem renda suficiente para o sustento básico. De cada 10 crianças que nascem pobres, sete morrerão nessa condição por falta de perspectivas. O crescimento econômico pífio dos últimos anos — média anual de 2% —, não foi suficiente para reduzir as desigualdades sociais. Os sistemas de educação e de saúde estão precários, tamanho o desvio de verbas.

O Estado mexicano foi tomado pelos desmandos, totalmente aparelhado pelas corporações e pelo empresariado guloso por benesses. Num ranking composto por 180 países, o México aparece na 135ª posição quando o tema é corrupção. Hoje, é impossível saber no México onde acaba o setor público e começa o setor privado, tal emaranhado de interesses. Os donos do poder surrupiaram todas os governos, as estatais, as polícias, essas, totalmente dominadas pelo narcotráfico, que comandou uma onda de assassinatos durante o processo eleitoral, um dos mais violentos que se tem notícia.

Obrador promete limpar o sistema e derrotar o establishment que levou o México para situação tão deplorável, tudo com a complacência do atual presidente, Enrique Peña Nieto, cujo governo foi marcado por sérias irregularidades, pelo aumento do fosso que separa ricos e pobres e pela resignação ante os ataques proferidos pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. O futuro comandante do México acredita que pode mudar o rumo desse caminho tortuoso, inclusive com uma relação mais promissora com o país vizinho e o fortalecimento do Nafta, acordo comercial que mantém com os EUA e o Canadá.

Não é só. Obrador também foi eleito com a promessa de implantar programas sociais para reduzir a pobreza, aumentar o salário mínimo e ampliar a participação do governo no setor de petróleo, que foi reduzida por Peña Nieto. É importante lembrar, contudo, que a situação fiscal do México não é das melhores. A dívida pública está em 54% do Produto Interno Bruto (PIB). Ao menor sinal de desequilíbrio nas contas federais, Obrador será testado pelos investidores, que já o veem com reserva, temendo que o populismo passe a ser a tônica da futura administração.

O México já havia negado, por duas vezes (2006 e 2012), a Presidência da República a Obrador. Desta vez, em meio ao fastio e à fadiga com os políticos, cedeu aos apelos do esquerdista para mostrar que será diferente de tudo o que se viu nos últimos anos. O país é a 15ª economia do planeta, com grande potencial para deslanchar. Mais quatro anos de decepção serão terríveis para uma população que já pagou um preço muito alto pelo descaso. De péssimos exemplos, a América Latina está cheia.


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