Editorial É necessário avançar mais

Publicado em: 14/06/2018 03:00 Atualizado em:

O Supremo Tribunal Federal, por meio da Primeira Turma, restringiu o foro privilegiado para os ministros de Estado. O STF só julgará ministros que tenham cometido crimes relacionados ao cargo e no exercício da função. Exceto isso, as ações deverão ser apreciadas pela Justiça de primeira instância. A decisão foi motivada por denúncia contra o ministro da Agricultura, Blairo Maggi, acusado de corrupção ativa em suposta compra de vaga no Tribunal de Contas de Mato Grosso, em 2009, quando era governador. No mês passado, o STF tomou decisão idêntica em relação a deputados e senadores. Quando um parlamentar cometer um ilícito não relacionado ao mandato, a ação será apreciada pela Justiça Estadual.
Aos poucos, a blindagem que sempre garantiu a impunidade de autoridades públicas vem se rompendo. Atualmente, estima-se que pelo menos 54 mil pessoas ainda são beneficiadas pelo foro privilegiado. Na prática, trata-se de tratamento vergonhoso e que colide com o artigo 5º da Constituição Federal, pelo qual “todos são iguais perante a lei”. O artifício, que permite uns serem julgados pelo Supremo e outros pela Justiça de Primeira Instância, estabelece uma diferença que merece o repúdio da maioria da sociedade brasileira.
A morosidade da Justiça é algo também inaceitável pelos brasileiros. Esse tempo se alarga todas as vezes que um processo é submetido à decisão de uma instância superior do Judiciário. É com isso que a maioria das autoridades, até agora protegidas pelo foro privilegiado, contam para ficarem livres de punições. Recentemente, uma ação contra um senador ficou parada durante 14 anos no STF e acabou arquivada. Ele era suspeito de ter desviado dinheiro federal destinado ao município de Cantá, em Roraima. Ao ser eleito para o Senado, as investigações nem sequer foram concluídas pela Polícia Federal, pois havia necessidade de sinal verde da Alta Corte. Não fosse protegido pelo foro privilegiado, o parlamentar, denunciado em 2002, poderia ter sido punido pelos supostos crimes que teria praticado em 2001, com pena prevista de até 16 anos de reclusão.
Embora tenha havido um avanço, as decisões do STF são insuficientes para garantir a aplicação da lei como deseja a maioria dos brasileiros. Na Câmara dos Deputados tramita projeto que restringe o benefício do foro privilegiado aos chefes dos Três Poderes. O projeto não avança, por motivos óbvios. Grande parte dos integrantes do Legislativo está ameaçada por denúncias de crime de corrupção, apuradas pelas sucessivas operações do Ministério Público e da Polícia Federal, realizadas a partir da Lava-Jato e por outras investigações que antecederam ao maior escândalo da República.
As mudanças ocorridas até agora são insatisfatórias. A sociedade cobra equidade no tratamento, pelo Judiciário, de todos que cometem ilícitos. Exige que legisladores e autoridades de todos os escalões do poder público sejam igualmente tratados com o rigor aplicado aos cidadãos comuns que incorrem em infrações penais. Não há outra forma de tornar vivo o mandamento constitucional enquanto houver tratamento privilegiado aos que ocupam cargos públicos e deles fazem uso para enriquecimento ilegal ou em favor de grupos que conspiram contra o interesses do público.


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