Editorial Equidade e respeito

Publicado em: 11/06/2018 03:00 Atualizado em: 10/06/2018 21:35

O gabinete do novo premiê socialista da Espanha, Pedro Sanchez, é o mais feminista da história espanhola: 11 mulheres e seis homens.O país integra o grupo de nações com mais igualdade entre os sexos, ao lado da Holanda, Suécia e Dinamarca, segundo o ranking da Organização das Nações Unidas. Guindar um time feminino para enfrentar desafios como desemprego recorde de 16,7% e deficit público de 18 bilhões de euros, vai além de uma resposta à luta dos movimentos feministas. Em parte, essa composição reflete o ambiente em que Sanchez, 46 anos, foi criado, e projeta uma imagem diferenciada do Partido Socialista para a sociedade em que as mulheres somam quase 51%.

A novidade nem de longe assegura governabilidade para a gestão de Sanchez, pois a oposição ao seu partido, o Socialista Operário Espanhol (PSOE), congrega 350 deputados, enquanto os aliados somam 84 no parlamento. Mas não deixa de ser um marketing positivo tanto para as mulheres quanto para a legenda em futuras disputas eleitorais. Trazer as mulheres para o campo das decisões é romper com o preconceito e a discriminação que existe no universo corportativo.

Estudo do Projeto Mulheres Inspiradoras, com base em cruzamento de dados do Tribunal Superior Eleitoral, ONU e Banco Mundial, mostrou que, em 186 países, só 17 têm mulheres como chefes de governo atualmente, ou seja, 97% da população mundial é governada por homens. A realidade brasileira é parte dessa disparidade. Hoje, o Executivo tem apenas uma mulher em cargo equivalente ao de ministro — Grace Maria Mendonça à frente da Advocacia-Geral da União. A média mundial chega a 18% de mulheres no primeiro escalão.

No Brasil, a redução da desigualdade entre os sexos ainda está muito aquém dos países desenvolvidos. Desde a Proclamação da República, foram 35 governos e só um deles sob o comando de uma mulher. O Supremo Tribunal Federal foi criado em 1891 e por 109 anos foi um espaço masculino. A tradição foi rompida em 2000, quando o então presidente Fernando Henrique Cardoso nomeou Ellen Gracie para uma vaga na mais alta Corte do país.

Os poucos avanços ocorridos ao longo de décadas estiveram, até recentemente, ameaçados. Em 2015, as mulheres foram às ruas contra projeto de lei em tramitação na Câmara dos Deputados, que pretendia criminalizar o aborto em caso de estupro, quando essa é a única exceção em caso de gravidez indesejada, liderados pelo então presidente da casa, deputado Eduardo Cunha. O movimento chegou a ser denominado de “Primavera feminista”, que reuniu mais de 15 mil mulheres em passeata na capital de São Paulo e centenas em várias capitais do país.

Em ano eleitoral, a desigualdade ganha realce. Desde 1997, por meio da Lei 9.504, todo partido ou coligação deve contar com, no mínimo, 30% de candidatas. As legendas não descumprem a lei, mas não escolhem mulheres com potencial de voto ou não investem nas que teriam condições de chegar ao cargo eletivo postulado. Resultado: na Câmara, a representação feminina chega a 10,6% em relação ao total de deputados, e a 16%, no Senado. Assim, o Brasil, entre 192 países, ocupa 152º lugar no ranking de representatividade feminina na Câmara, atrás de Senegal, Etiópia e Equador.

Mudar a realidade exige muita organização das mulheres, políticas públicas contra as desigualdades de gênero, fiscalização mais rigorosa para que a legislação partidária seja cumprida como concebida e, o mais importante, educação que elimine o machismo ainda dominante nas relações de gênero. Sem o acesso das mulheres aos postos de mando, não haverá equidade entre os sexos no país nem a cultura de respeito.

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