Um casamento com diversidade

Maurício Rands
Advogado, PhD pela Universidade Oxford, Secretário de Acesso a Direitos da OEA. As opiniões são pessoais .

Publicado em: 21/05/2018 03:00 Atualizado em: 21/05/2018 09:00

A personalidade da rainha Elizabeth foi bem exposta na série ‘The Crown’, da Netflix. Seu rigor e apego aos rituais poderiam deixar dúvidas sobre sua aprovação às inovações da cerimônia de casamento do príncipe Harry com a atriz californiana Meghan Markle. ‘Um casamento que sacudiu a poeira das tradições da monarquia’, como sapecou o The Guardian. A começar pelas raízes afro-americanas da noiva e de sua mãe.  Entre os 600 convidados que tiveram acesso à capela de São George, no Castelo de Windsor, uma presença de afrodescendentes em proporções nunca antes vista em casamentos da realeza britânica. Uma celebração centrada na diversidade. O bispo oficiante, Michael Curry, é um afrodescendente nascido em Chicago que se tornou o primeiro afro-americano a dirigir a Igreja Episcopal Americana. Sua pregação roubou a cena, ao falar do amor, invocar Martin Luther King Jr e a resiliência da fé durante a escravidão.

Outros convidados reforçaram a diversidade como marca do evento, a exemplo da apresentadora de TV Oprah Winfrey. O fundo musical, cantado por um coral negro, combinou clássicos de Bach e Handel com o gospel ‘Stand By Me’, cantado por Ben E. King, que antes já o havia sido por John Lennon. Na recepção, Harry e Meghan foram brindados com uma canja de Elton John e fizeram breves discursos. Assim quebrando mais protocolos. Não parece ser mero detalhe o traje do noivo. Ele e seu irmão, o futuro rei William, usavam uniformes do regimento ‘Blues and Royal’ em que serviram. O noivo, por longo período, no Afeganistão. Também tendo feito trabalhos humanitários na África. A seu turno, Meghan tem sido uma militante de causas sociais trabalhando com mulheres em favelas indianas para fornecer produtos de higiene feminina acessíveis. A sinalizarem, ambos, com a mensagem de que os poderes devem servir a nação. Ainda que sejam poderes tradicionais e tenham origens não democráticas como as monarquias. A mostrarem que junto com as oportunidades devem vir as responsabilidades.

Um estado é formado por seu povo, território e governo. Um povo é formado por suas línguas, culturas, valores, história e tradições. A rainha Elizabeth já demonstrou compreender suas responsabilidades de chefe de estado. Sabe que a monarquia britânica tem funcionado como amálgama da unidade do povo britânico, da preservação de sua história, valores e tradições. Por isso, a rainha compreendeu que a força dessas instituições reside também em sua capacidade de se renovar. Um casamento real com tão forte presença da diversidade talvez antes fosse impensável.  Assim como um matrimônio inter-racial na própria família real. Não deixa de ser um bom sinal em tempos de xenofobia, racismo, populismo e Brexit. Bom exemplo que vem de um matrimônio-espetáculo visto por milhões em todo o mundo.

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