Editorial Os dois lados da moeda

Publicado em: 21/05/2018 03:00 Atualizado em: 21/05/2018 09:00

A disparada dos preços do dólar deve ser vista como um importante sinal de alerta. Se o Brasil não fizer as reformas necessárias para ajustar as contas públicas, será engolfado por uma crise semelhante à que obrigou a Argentina a elevar os juros para 40% ao ano e a pedir socorro ao Fundo Monetário Internacional (FMI). Felizmente, ainda estamos em uma situação mais confortável quando comparados com o nosso vizinho. Mas temos fragilidades que nos tornam vulneráveis num mundo cada vez mais avesso ao risco.

Nos últimos anos, o país conseguiu reduzir o deficit externo. A dívida do governo em moeda estrangeira não chega a US$ 80 bilhões. O Brasil, com reservas internacionais de US$ 380 bilhões, é credor internacional. Os investimentos estrangeiros continuam migrando para cá. Por esse ângulo, não há por que se preocupar com a maré ruim que anda tirando o sono dos governos de nações emergentes, cujas moedas estão derretendo frente ao dólar. Esse é o lado bom da moeda.

Quando se olha para outro lado, o quadro é completamente diferente. As contas públicas estão em frangalhos. Este será o quinto ano seguido de deficit, que pode atingir R$ 159 bilhões. Na melhor das hipóteses, as finanças federais só sairão do vermelho em 2021. Isso, se o próximo governante assumir compromissos claros e firmes com reformas. Sem ajustes na Previdência Social, não há como se falar em equilíbrio entre receitas e despesas. Nesse contexto, o crescimento, que já está fraco, minguará de vez e a inflação voltará a dar as caras.

Por enquanto, o impacto da alta do dólar no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) é mínimo. Mas, mantida a cotação acima de R$ 3,70, muitos produtos e serviços tenderão a ficar mais caros. Não por acaso, o Banco Central anunciou que, a partir desta segunda-feira, aumentará a intervenção no câmbio. Mesmo que não diga explicitamente, a autoridade monetária quer evitar que os repasses da alta da moeda norte-americana contaminem as expectativas dos agentes econômicos. Por enquanto, o BC suspendeu o processo de queda dos juros. Mais à frente, se a situação piorar, poderá elevar a taxa Selic.

Ante essas ameaças, é vital que o governo e o Congresso deem respostas rápidas e aprovem medidas que facilitem o ajuste fiscal. Quando o projeto de reforma da Previdência foi enterrado, a equipe econômica apresentou um pacote compensatório para manter as contas públicas sob controle. Nada, porém, andou no Legislativo. Agora, a urgência se impõe. Não há mais espaço para irresponsabilidade. O Brasil já pagou um preço alto demais pelos dois anos de recessão impostos pela administração de Dilma Rousseff.

O recado vale, também, para aqueles que se apresentam como candidatos a comandarem o Brasil a partir de 2019. Quanto mais forem transparentes em suas propostas para o país, quanto mais empenhados estiverem com o ajuste das contas públicas, menores serão os riscos para a economia. É assim que deve ser. Não é mais aceitável que um movimento atípico no mercado de câmbio se torne uma ameaça a conquistas tão importantes: inflação no nível mais baixo em duas décadas e os menores juros da história.

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