Mãe e filha

Luciana Grassano Melo
Professora de Direito da UFPE

Publicado em: 14/05/2018 09:00 Atualizado em:

Dizem que quando somos mãe, deixamos um pouco de ser filha. E eu me vejo presa na saudade do tempo em que eu era apenas a sua filha. Do tempo em que já existiam responsabilidades, que chegaram cedo em minha vida, mas do tempo quando o tempo não tinha corrido tanto ainda, para já ter deixado seu rastro de perdas infindas.

Me vejo presa na saudade de um tempo em que sentia a vida como uma floresta fechada numa mata de árvores frondosas, altas e fecundas e seu colo era a certeza de um sonho bom, como a ideia de dormir num leito de folhas verdes, recém-caídas.

Dizem que quando somos mãe, deixamos um pouco de ser filha. E eu me vejo presa na saudade de um tempo em que não tinha passado tanto tempo ainda para que já visse as pessoas, tirados os filtros da fantasia. Desse tempo, por ter recebido amor tão verdadeiro, guardo a imagem do seu sorriso como um copo cheio de água que se não matava a sede voltava a se encher, tão logo esvaziava.

Guardo o cheiro da comida feita com mãos de amor e a lembrança de uma mesa sempre posta, capaz de alimentar-me de quimeras pueris. Lembro de olhos bondosos e obsequiosos de que jorravam uma compreensão de mim maior ainda do que aquela que eu, tão jovem, já tinha a meu respeito.

Dizem que quando somos mãe, deixamos um pouco de ser filha. E se, como mães, nos sentimos tão imperfeitas, como filha encontro você no retrato que vejo de um céu todo azul em dia de praia, com um mar imenso e salgado de águas calmas que me convida a nadar.

Como filha, encontro você no retrato que vejo de uma rede que me balança enquanto leio, na paisagem de minha janela que aprecio enquanto tomo um café bem quente de manhã cedo, na alegria que me comove quando penso belas metáforas e escrevo frases sentidas e verdadeiras.

Dizem que quando somos mãe, deixamos um pouco de ser filha. E como mãe, no seu dia, levo meu filho a sua casa para beijá-la e abraçá-la. E como filha, no seu dia, levo o meu coração, que traduzi nessas palavras, para dizer tantos obrigadas quanto possa, até varar a noite, até cansar, até perder a voz. Como filha, levo meu coração para lhe dizer que tanto mais amor a todos dedique, mais esse amor lhe retorna em quinhão de beleza, serenidade e sabedoria.

Os comentários abaixo não representam a opinião do jornal Diario de Pernambuco; a responsabilidade é do autor da mensagem.