Editorial O déficit e as tragédias

Publicado em: 03/05/2018 03:00 Atualizado em: 03/05/2018 05:59

O déficit habitacional no país chega a 6 milhões moradias. Os sem-teto ocupam 145 mil imóveis em todo o Brasil, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A maior demanda (40%) está no Sudeste, e a menor carência, no Centro-Oeste (8%), de acordo com os dados do governo. O desabamento de um prédio da União que abrigava 170 famílias, no centro de São Paulo, é mais do que uma advertência ao poder público. A tragédia foi anunciada. Laudo do Corpo de Bombeiros, em 2015, denunciava insegurança do local, suscetível a incêndios e com estrutura comprometida.

A corporação recomendou a retirada dos ocupantes, ligados ao movimento Luta por Moradia Digna (LMD). Em três anos, nada foi feito. O prédio pegou fogo e desabou. Pelo menos, uma pessoa morreu. Falha na fiscalização, negligência das autoridades, burocracia entre os poderes municipal, estadual e federal, que postergou decisões. Esses fatores, quase sempre, se somam e resultam em desfechos dramáticos. A deficiência na política habitacional e as ocupação irresponsáveis estão na base do problema.

Durante muitos verões na região serrana do Rio Janeiro, moradias penduradas em encostas derretiam com o aumento dos temporais, apesar de todos os alertas para que as pessoas fossem retiradas das áreas de risco. Episódios idênticos ocorrem no Nordeste, e nas cheias dos rios no Norte do país. Raras são as situações em que famílias não perdem os entes queridos e os poucos bens que têm.

Em São Paulo, 150 construções estão ocupadas irregularmente por pessoas que não têm onde morar. Com a crise econômica, que levou o país à recessão por três anos, desde 2014, muitos brasileiros não puderam honrar os contratos de aluguel. Trocaram a residência, compartilharam imóveis ou engrossam os movimentos dos sem-teto.

O programa Minha Casa Minha Vida, destinado às famílias de menor renda, foi afetado pelo rombo nas contas públicas. Os investimentos encolheraram. Em 2017, a meta de 610 mil contratações ficou em 495 mil, sendo 23 mil para atender a famílias com renda mensal de até R$ 1,8 mil. Hoje, o Ministério da Cidade tenta recuperar a diferença e avançar na entrega de moradias. A meta para este ano é chegar a 130 mil contratos. A cinco meses das eleições de outubro, as possibilidades de avanço são remotas. Aos governos municipais e estaduais interessam os grandes empreendimentos imobiliários, que asseguram maior recolhimento de impostos.

Investir em moradias populares não implica prejuízo para os cofres públicos. O retorno se dá pela garantia de mais segurança às famílias, menos doenças, menos conflitos sociais, além de ser dever do Estado, em resposta às necessidades da população. A omissão, sim, é prejudicial a todos. Países desenvolvidos transformam imóveis ocupados em moradias dignas para os cidadãos. No Brasil, se o imóvel é de algum ente do Estado, apela-se para a reintegração de posse, com forte aparato de segurança. Privilegia-se o uso da força em vez do bem-estar contra os que pouco ou nada têm.

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