O Planejamento da Longevidade e a Declaração CISS de Cancun

Maurício Rands
Advogado, PhD pela Universidade Oxford, Secretário de Acesso a Direitos da OEA.

* As opiniões são pessoais e não representam as da OEA.

Publicado em: 23/04/2018 03:00 Atualizado em: 23/04/2018 09:12

Escrevo desde o México, onde vim representar a OEA no evento dos 75 anos da Conferência Interamericana de Seguridade Social. A CISS lida com a proteção e a seguridade social em 37 países das Américas e Caribe, com 87 instituições. Entre as quais OEA, OPAS, OCDE, OIT, Banco Mundial, OIM, PNUD, CEPAL e SELA. A OEA contribui para o aperfeiçoamento da proteção social no hemisfério. Atua como secretaria técnica para as reuniões dos ministros de desenvolvimento social, bem como para as dos ministros de trabalho. Dessas ministeriais surgiram a Rede Interamericana de Proteção Social (RIPSO) e a Rede Interamericana de Administração Laboral (RIAL).

Como realçou o representante da OIT no evento, o brasileiro Helmut Schwarzer, o desafio continua sendo o de estender a cobertura e a proteção efetiva a um maior número de pessoas. No mundo, somente 45% da população têm cobertura efetiva de ao menos um benefício de proteção social. Nas Américas, 33% da população não estão cobertos pelos sistemas de proteção e seguridade social. Isso torna difícil o atingimento do objetivo 1.3 da Agenda 2030 dos ODS, que visa ‘pôr em prática a nível nacional sistemas e medidas apropriadas de proteção social para todos, incluídos níveis mínimos’.

A CISS tem trabalhado de forma sustentada para fomentar a cobertura universal, através da incorporação progressiva de grupos populacionais ainda não cobertos. Busca promover una longevidade produtiva, saudável e digna. Luta para que as mulheres, os migrantes e outros setores vulneráveis tenham trabalho e aposentadoria digna. Alguns propõem a rediscussão do modelo contributivo para atenuar as perdas decorrentes de interrupções como as licenças para cuidar de filhos, etc. Outros propõem que se considere o tempo de trabalho doméstico para que se outorguem benefícios às donas de casa que fazem um trabalho invisível. Mencionou-se o caso do Equador que, em sua Constituição, declarou o trabalho não remunerado como trabalho produtivo. E, assim, garantiu que as mulheres que trabalham como donas de casa podem se aposentar. No caso dos migrantes, analisaram-se mecanismos para favorecê-los. Propõe-se a celebração de acordos bilaterais e multilaterais entre países emissores, de trânsito e de destino para que sejam somados os anos trabalhados e o tempo de contribuição para os fundos de pensão dos países envolvidos.

A Declaração de Cancun, aprovada na AGE dos 75 anos da CISS, reafirma a proteção e a seguridade social diante dos novos desafios, das mudanças demográficas, da transição epidemiológica, dos riscos do trabalho, da automação e da mudança na natureza dos empregos. Ratifica o entendimento de que a garantia de seguridade social aos povos representa um fator de desenvolvimento dos países. Reconhece que os mercados de trabalho derivados de novas tecnologias vão precisar de novas abordagens para a questão da seguridade social de seus participantes. O direito à seguridade social é definido como  ‘um direito humano ao qual todos os membros de uma sociedade devem ter acesso, bem como um requisito indispensável para alcançar a coesão e a justiça social. É também uma ferramenta poderosa para reduzir a pobreza canalizando maiores investimentos para o desenvolvimento humano e social’. O documento referenda os princípios que devem nortear a seguridade social: solidariedade, universalidade, participação, igualdade de tratamento, integralidade e corresponsabilidade. Esse último princípio é reforçado diante das mudanças recentes. Reconhece-se que as mudanças tecnológicas e as do mercado de trabalho requerem uma crescente participação combinada de todos os atores. O que implica também a responsabilidade dos próprios beneficiários. Inclusive com educação financeira para um bom planejamento não apenas das respectivas aposentadorias. Trata-se de, mais amplamente, planejar a própria longevidade. Para um sistema universal de cobertura, afirma-se que os riscos terão que ser compartidos entre o Estado, o sistema segurador e os próprios indivíduos beneficiários.

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