Editorial Ataque não muda situação da Síria

Publicado em: 17/04/2018 03:00 Atualizado em: 17/04/2018 09:16

A história se repetiu. Há um ano, os Estados Unidos bombardearam alvos sírios. As razões alegadas foram as mesmas — o ditador Bashar al-Assad teria lançado gases venenosos contra os opositores. Em 14 de abril, nova ofensiva, sem o aval do Conselho de Segurança da ONU. A título de resposta ao suposto ataque químico do dia 7 que ceifou dezenas de vidas no subúrbio de Douma, controlado por rebeldes, Washington atingiu três instalações que produziriam e armazenariam arsenal proibido por convenções internacionais.

Usar o condicional e evitar afirmações incontestáveis não se deve ao acaso. Pairam dúvidas sobre a autoria da investida. O apoio da Rússia permitiu que o governo reconquistasse quase todo o território e praticamente assegurasse a vitória final. O tempo corre a seu favor. Por que o ditador se indisporia com as consciências civilizadas do mundo se não tiraria proveito do ato? Seria um tiro no pé.

Em fevereiro, 10 meses depois do ataque de 2017, o secretário de Defesa americano admitiu ao Congresso não ter provas de que Assad seria o autor da agressão contra o próprio povo. Daí por que se aventam hipóteses de que a reação da Casa Branca se deve muito mais ao temperamento e aos projetos políticos de Donald Trump que a razões humanitárias. Em tuíte postado logo depois de tomar conhecimento da barbárie, o presidente chamou o ditador sírio de “animal”.

Não retaliar à altura poderia passar a imagem de fraqueza, que ele tanto criticara no antecessor. Barack Obama ameaçou que, se Damasco ultrapassasse a linha vermelha, teria resposta. Em 2013, o limite foi desrespeitado. Obama não cumpriu a palavra. Além disso, sem os bombardeios, a Rússia, aliada do regime sírio, poderia sair fortalecida. Há mais. Trump enfrenta problemas internos. O velho truque de desviar a atenção para o exterior viria em boa hora.

A ação não alterará o curso da guerra civil, que se arrasta por sete anos e soma mais de 500 mil mortos. O regime do violento e sanguinário Bashar não parece afetado pelo ocorrido na semana passada. O presidente manteve a rotina, e Damasco dava a impressão da normalidade de sempre. É importante que os fatos sejam esclarecidos. Inspetores da Organização de Proibição de Armas Químicas (Opaq) precisam investigar com quem está a verdade.

Seja qual for o resultado, porém, uma conclusão parece certa. Com a ONU enfraquecida, o apoio incondicional da Rússia, e a retirada das tropas americanas do território deflagrado, o ditador Bashar al-Assad caminha rumo à vitória. O grande derrotado é, sem dúvida, o povo sírio. A guerra provocou a destruição de cidades, a diáspora da população e meio milhão de cadáveres — a maioria civis. O horror é tal que desafia a comunidade internacional a não só proibir as armas químicas. Deve, também, acabar com as armas convencionais, responsável pelo maior número de vítimas.

Os comentários abaixo não representam a opinião do jornal Diario de Pernambuco; a responsabilidade é do autor da mensagem.