O sequestro da democracia

Paulo Rubem Santiago
Professor da UFPE, mestrando em Educação

Publicado em: 12/04/2018 03:00 Atualizado em:

Após sete eleições presidenciais desde 1989, o que vimos no país foi o crescimento da influência do poder econômico na sustentação dos partidos políticos em anos não eleitorais e sua presença mais que abusiva a cada dois anos nas campanhas majoritárias e proporcionais. As obras para a Copa de 2014 e para os Jogos Olímpicos não escaparam desse mecanismo público-privado. Haja corrupção. Ao lado disso, com a globalização financeira e a livre circulação de capitais, a autonomia dos estados nacionais para decidir o investimento em políticas sociais, da produção industrial e a busca do pleno emprego com distribuição de renda, segundo estratégias de um projeto autônomo de desenvolvimento, parece estar com os dias contados. A etapa presente do capitalismo mundial é implacável. Ou os estados nacionais atendem aos seus interesses de acumulação ou de nada valerá a vontade dos eleitores e os compromissos de campanha anunciados por alguns dos eleitos ao governo das nações periféricas. Isso significa se deixar monitorar pelo FMI, por agências de rating, pelo mercado financeiro, que determinam quais devem ser as políticas monetária, tributária, fiscal e cambial e de que forma as finanças públicas devem ser conduzidas para atender às prioridades do capital, sobretudo através da dívida pública. Fecha-se, assim, o círculo de ferro que ataca a soberania das nações e a vontade do povo nas urnas. De um lado há o derrame de dinheiro privado, tanto lícito quanto criminoso, nas campanhas eleitorais e na sustentação permanente de diversos partidos políticos registrados no TSE. Basta conferir no site do Tribunal. Do outro há a pressão intensa daqueles que, ainda que derrotados nas urnas, teimam em ditar os rumos da macroeconomia, com seus editorais na mídia, repetidos comentários de jornalistas atrelados aos interesses do mercado, publicações de federações e confederações empresariais, enfim, um arsenal de pressão e chantagem que tenta, a todo custo, reverter o resultado das urnas e a vontade do povo, impondo o desejo dos mercados. A história já provou que a democracia só é tolerada pelos donos do poder e do capital quando produz resultados de seu interesse. Quando, porém, a maioria do eleitorado se convence e apoia determinadas propostas votando em candidatos, alianças ou programas que caminham por novos rumos, logo se associam grupos políticos, empresariais e forças militares, ameaçando intervenções, patrocinando golpes ou sabotando, com intenso noticiário, ataques políticos e empresariais, os novos caminhos a serem trilhados. Não foi o que houve em 1964? A democracia foi violentada repetidas vezes nos últimos anos. A vontade das urnas não se faz respeitar pelos oligopólios de mídia. A independência do eleitor foi assassinada pelo poder econômico nas campanhas, com a conivência, muitas vezes, de muitos, de milhões dos próprios eleitores. Não há esperança de combate às desigualdades dessa forma, de elevação da qualidade social de vida, trabalho e renda do povo, com tais mecanismos. Ou são rompidos legal, democrática e politicamente ou aprofundar-se-á o caos, a concentração de riqueza e de poder no país. O que nos pressionam a assumir os países centrais, a austeridade fiscal, o corte de direitos sociais, a precarização do trabalho, não é o que praticam em suas próprias sociedades, como se viu nos Estados Unidos após a crise financeira de 2008 e 2009. A força do capital e a pressão ideológica da grande mídia fraudam a formação da livre consciência do cidadão nas escolhas democráticas que faz, violentando a legalidade e a legitimidade do voto. A democracia independente e a soberania do estado à serviço da maioria devem ser reconquistadas.

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