Editorial Sem duas medidas

Publicado em: 26/03/2018 03:00 Atualizado em: 26/03/2018 09:20

O Supremo Tribunal Federal (STF) adiou para 4 de abril a decisão sobre o habeas corpus, apresentado pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e concedeu um salvo-conduto para evitar que ele seja preso tão logo o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) conclua a análise do recurso contra a decisão que o condenou a 12 anos e um mês de prisão, em segunda instância, pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro, no âmbito da Operação Lava-Jato.

Inegável a frustração causada à sociedade. Há muito, ela clama pelo fim de todos os privilégios, envolvendo políticos, magistrados e legisladores. Os brasileiros cobram uma Justiça mais célere e que não poupe dos rigores da lei nenhum político, empresário, seja lá quem for, mas, principalmente, os que praticam ou se beneficiam da corrupção. A população tem consciência dos danos que os desvios do dinheiro público causam no dia a dia de cada cidadão.

As operações especiais do Ministério Público Federal e da Polícia Federal, desde o mensalão, em 2005, e, em seguida, a Operação Lava-Jato (2009), sinalizaram aos brasileiros que o país poderia tomar novos rumos e que a impunidade seria triste recordação do passado. Em todo esse processo, o Supremo teve destacado papel, desconhecendo recursos protelatórios dos condenados nas instâncias inferiores.

O Supremo foi além. Reconheceu, em fevereiro de 2016, como legítima, a prisão de condenado em segunda instância. Em outubro do mesmo ano, ratificou a decisão em Ação Declaratória de Constitucionalidade, apresentada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e pelo PEN contra o entendimento da Corte. A negativa do STF foi um marco, com apoio do Ministério Público Federal, para estancar a impunidade construída pelas inúmeras brechas legais que sempre permitiram aos que têm dinheiro descumprir as sentenças, em flagrante deboche da autoridade judicial. O condenado em segunda instância deve cumprir a pena de privação de liberdade, pois isso não o impede, se se sente injustiçado, de buscar os remédios jurídicos para ser solto.

Hoje, quando centenas de políticos e empresários estão envolvidos em processos de corrupção, contra o Supremo convergem pressões de todas as ordens para que os ministros revejam suas convicções. A ministra Cármen Lúcia, presidente do STF, resiste. Ela, bemcomo outros ministros, estão em sintonia não só com a lei, mas com os anseios da sociedade.

Mudar a decisão será retrocesso inadmissível ante os avanços decorrentes da cruzada contra a corrupção e a vitória da impunidade. Significará que os corruptos podem agir livremente sem qualquer risco de punição. Consolidará a ideia de que o mandamento constitucional — “todos são iguais perante a lei” — não passa de um sofisma, num país pleno de desigualdades e injustiças socioeconômicas.

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