A morte tardia da Reforma da Previdência

Humberto Costa
Líder da Oposição no Senado (PT)

Publicado em: 16/03/2018 03:00 Atualizado em: 16/03/2018 08:13

Um dos temas mais nefastos gestados pela administração de Michel Temer (MDB), a Reforma da Previdência foi - depois de incontáveis embates - retirada da pauta presidencial e, consequentemente, cessaram as negociações com o Congresso Nacional sobre ela. Mas, longe de ter sido uma ponderada decisão do Planalto, a desistência em seguir foi resultado da luta de milhares de brasileiros que questionaram o projeto e a falta de legitimidade do governo para defender uma pauta dessa magnitude, com grande impacto para essa e as futuras gerações.

Temer tentou, mas, com a proximidade das eleições, não conseguiu desta vez transformar o Congresso num balcão de negócios. A insatisfação popular diante de mais uma medida que tira direitos do trabalhador, de aposentados e pensionistas e mantém privilégios dos mais ricos gritou mais forte, e o medo de um desgaste eleitoral pesou mais do que os bilhões retirados do erário para, nababescamente, comprar a consciência e os votos de parlamentares aliados.

Vale destacar que o mesmo homem que se aposentou aos 55 anos e ganha hoje mais de R$ 30 mil mensais é o que quer elevar o tempo de contribuição, aumentar a idade mínima, modificar o sistema previdenciário dos servidores públicos e, na prática, acabar com o direito de aposentadoria integral, exigindo 40 anos de contribuição para que se tenha acesso a 100% do benefício. Tudo isso sem debate com a sociedade e, acima de tudo, com a chancela de um governo sem voto, sem credibilidade e com os maiores índices de rejeição da história.

Aos mais pobres, que paguem com suas magras aposentadorias e pensões. Aos grandes devedores, perdões de dívidas e nada de cobranças. A CPI da Previdência Social do Senado provou, por exemplo, que grandes corporações, como o Bradesco e o Itaú, devem R$ 426,07 bilhões ao Sistema Previdenciário brasileiro.

Sem votos para aprovar essa desastrosa reforma, coube a Temer, o mesmo que usou de milhares de artimanhas para derrubar uma presidente legitimamente eleita, mais uma manobra pirotécnica e irresponsável. Para não sair vergonhosamente derrotado pela pressão popular, o presidente decidiu colocar o tema pra debaixo do tapete e mudar o foco às vésperas da eleição. Em busca de nacos de popularidade, decidiu decretar uma desastrosa e não planejada intervenção militar no Rio de Janeiro, ocupando, a passos de coturno e sob armas, as comunidades pobres fluminenses.

Até agora, a operação não produziu qualquer resultado prático. Tem como sua grande marca o fichamento de moradores de áreas carentes, o que estigmatiza ainda mais aqueles trabalhadores que tiveram pouca ou nenhuma oportunidade. A teatralização da medida diante das câmeras é o que verdadeiramente importa para o Planalto. Enquanto o problema da violência aumenta em todo o Brasil, um presidente aturdido tenta fazer uso político das Forças Armadas brasileiras em proveito pessoal, como seu próprio marqueteiro admitiu.

Não foi por acaso que acadêmicos, artistas, intelectuais, políticos, juristas e movimentos sociais demonstraram publicamente repúdio à intervenção. Entre eles, a organização de direitos humanos Justiça Global, que enviou um informe à Organização das Nações Unidas (ONU) e à Organização dos Estados Americanos (OEA) questionando a ação.  De nossa parte, seguiremos atentos, denunciando as arbitrariedades e nos somando à voz do povo contra qualquer nova escalada de opressão e de autoritarismo. Apesar da grande vitória que representou o aparente enterro da Reforma da Previdência, a cruzada de Temer contra os trabalhadores segue ganhando ares cada vez mais escandalosos. Não vamos descansar enquanto não restar dúvidas de que essas medidas estão definitivamente sepultadas.

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