Editorial Não esqueçam as consequências

Publicado em: 10/03/2018 03:00 Atualizado em: 12/03/2018 10:45

Um aluno do 4º semestre do curso de Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas (FGV), em São Paulo, ia passando pelas dependências da instituição quando viu um colega negro. Sem que ele percebesse, o fotografou e compartilhou a foto num grupo de whatsapp, com a seguinte legenda: “Achei esse escravo no fumódromo! Quem for o dono avisa!”.  Há muitas coisas a dizer sobre atitude tão brutal e vergonhosa. Mas gostaríamos de nos ater a dois pontos, sem que isso signifique desdém pelos demais. Primeiro ponto: quem age dessa forma, não consegue pensar no sofrimento que causa à vítima? Segundo: quem comete um crime (sim, é crime) desses não pensa nas consequências que o seu gesto trará?

Ontem, por exemplo, a FGV suspendeu o autor da injúria racial por três meses. Nesse período, está impedido de frequentar a escola e de cumprir qualquer atividade curricular. Além disso, o caso terá desdobramentos na esfera polícial, uma vez que o jovem agredido registrou um boletim de ocorrência. Em post publicado numa rede social, o rapaz vítima das ofensas afirmou: “Tão perto de mim… Por que não foi falar na minha cara? Mas você optou pela atitude covarde de tirar uma foto minha e jogar no grupo dos amiguinhos. Se seu intuito foi fazer uma piada, definitivamente você não tem esse dom. Acha que aqui não é lugar de preto? Saiba que muito antes de você pensar em prestar FGV eu já caminhava por esses corredores. Se você me conhecesse, não teria se atrevido. O que você fez, além de imoral, é crime! As providências legais já foram tomadas e você pagará pelos seus atos”.

O crime de injúria racial é previsto no Artigo 140, Parágrafo 3º, do Código Penal. Tem pena prevista de um a três anos e multa. Considera-se que “injuriar” consiste em “ofender o decoro ou a dignidade” a partir de elementos de cor, raça, etnia, religião, origem ou condição de pessoa portadora de deficiência ou idosa. O rapaz que se referiu ao colega de forma tão injuriosa certamente não se envergonha do seu gesto (talvez se diga envergonhado agora, na eventualidade de um pedido de desculpas). Pode ser que o seu racismo seja tão entranhado que dizer o que ele disse lhe pareça tão natural quanto andar pelos corredores da escola. Noves fora tudo isso, porém, ainda existe um dado imprescindível em cada ato que cometemos: as consequências. Como diria o Conselheiro Acácio, na citação famosa, o problema das consequências é que elas “vêm sempre depois” - quando o mal já está feito e é preciso arcar com as responsabilidades do ato praticado.

Vivemos hoje em um mundo de posições tomadas em segundos, sob impulso de nossas convicções - e, muitas vezes, compartilhadas logo a seguir. Não se pensa no outro nem em si próprio. Em um mundo ideal, o caminho a seguir seria o da reeducação interior em busca de valores humanistas. No mundo real, diante de situações que nos desafiam  (principalmente no caso de quem nutre sentimentos como o desse jovem que ofendeu o colega), é recomendável pensar antes de falar, pensar antes de agir e pensar nas consequências.

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